O impacto da informação contingente em contabilidade e auditoria
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8. Conclusões

No mundo actual, as empresas deparam-se com ambientes cada vez mais competitivos e globalizados, em que as mutações são portadoras de múltiplas incertezas. O que outrora era conhecimento agora é incerteza, o que se suponha estável tornou-se contingente, aquilo em que se podia confiar implica uma abordagem mais céptica. Os sistemas de informação contabilísticos, por sua vez, sentem dificuldades em responder adequadamente a aspectos como a realidade económica, os ciclos de vida mais curtos, as conjunturas instáveis, a competitividade crescente nos mercados, o peso crescente da fase comercial em detrimento da produção, a crescente importância dos intangíveis, a velocidade da informação, as circunstâncias dinâmicas e a complexidade de interdependências. As interacções económicas, sociais, políticas e culturais à escala internacional têm vindo a intensificar-se ao longo dos últimos anos e o impacto do fenómeno globalização introduziu conflitos entre o que é considerado como local ou endógeno e o que se concebe como global ou exógeno, originando rupturas e problemas de continuidade, obrigando-nos a enfrentar novos riscos, com velhas e novas inseguranças, para os quais a Contabilidade não está preparada.

A Contabilidade deveria ser capaz de relatar não só os resultados e a situação patrimonial da empresa, mas também analisar e ponderar acerca da sua posição competitiva, nível do conhecimento, estratégia, contingências, entre outros, numa vertente voltada para o futuro, de modo a alimentar o paradigma utilitarista. Os utilizadores das demonstrações financeiras tornam-se mais exigentes, querem da Contabilidade, um sistema de informação capaz, ou que pelo menos tente, anular ou reduzir o efeito dos riscos e incertezas, que lhes relate as expectativas da empresa, que seja capaz de transmitir aos destinatários os riscos potenciais e toda uma série de informação relacionada com as expectativas futuras, no seio da actividade da empresa, tendo em conta a envolvente da sua área de negócio, caminhando em passos largos para a reclamada informação financeira prospectiva. As actuais demonstrações financeiras não se adaptaram à nova situação económica, pelo que estão, consequentemente, a perder relevância e a tornar-se insuficientes como documentos expressivos da imagem fidedigna da unidade económica.

O tratamento da incerteza é feito, contabilisticamente, com base no princípio da prudência, o qual, na nossa perspectiva, nem sempre se coaduna com os objectivos primários da informação financeira, pelo que se procuraram novas soluções para o actual modelo de informação sobre acontecimentos incertos. Na verdade, o uso excessivo do conservantismo em nada contribui para o aumento da qualidade da informação financeira, questionando-se a alteração do objecto da Contabilidade, ou seja, se é preciso não só renovar os instrumentos e os modelos contabilísticos, mas também abarcar os fenómenos na sua globalidade, integrados no marco estratégico da empresa. A Contabilidade deve, então, caminhar no sentido da informação tempestiva e prospectiva, baseando-se em informações complementares, que não se enquadram no actual modelo de relato financeiro, apesar de todas as dificuldades na construção de novas peças contabilísticas e das derivadas da falta de um enquadramento normativo.

Esta situação carece de resolução, pelo que nos parece lógico o surgimento de novas demonstrações financeiras, sistematizadas, que englobem toda uma série de factores de risco e incerteza, e que permitam aos utilizadores da informação conhecer antecipadamente os cenários futuros e os desempenhos possíveis da empresa. Aquelas podem funcionar como demonstrações financeiras principais, ou apenas como importantes complementos às mesmas, as quais se tornariam, rapidamente, em peças fundamentais para o utilizador.

No que se refere à Auditoria, esta tem vindo a acompanhar as alterações ocorridas no meio onde as empresas operam. Inicialmente virada para a exactidão das demonstrações financeiras, a Auditoria passou, dadas as contingências do mundo económico, pelo que alguns autores denominam por "síndroma da mudança", estando actualmente virada para uma vertente de incerteza, onde a continuidade das empresas pode ser posta em causa em qualquer momento. Esta última perspectiva obriga os auditores a descentrarem a sua atenção das demonstrações financeiras tradicionais, para se concentrarem na análise estratégica da empresa, passando a considerá-la como um todo. A Auditoria, tendo por base a situação actual, tende a pronunciar-se sobre as orientações da empresa, em que o conhecimento do negócio do cliente, do sector de actividade e de toda a envolvente, são determinantes para que esta se possa pronunciar sobre tais expectativas e incertezas. Tudo isto é uma mais-valia que aumenta o papel social do auditor.

A tendência passa por se efectuarem análises mais qualitativas, na medida em que os dados se tornam menos verificáveis, não se podendo limitar aos ciclos de transacções, abarcando a empresa como um todo. A comprovação da bondade ou razoabilidade das magnitudes em causa envolve uma análise a factores e assunções que sejam significativos, sensíveis a variações, que se afastem em relação a dados históricos e que sejam subjectivos e susceptíveis de erros e enviesamento, para além da avaliação dos processos utilizados e resultados obtidos em comparação com uma magnitude independente e a revisão dos acontecimentos posteriores subjacentes. Esta evolução possibilita a redução do expectation gap, avançando-se para pronunciamentos sobre a continuidade/viabilidade da empresa auditada. O relatório de auditoria torna-se, assim, determinante na garantia de uma certa fiabilidade deste tipo de informação, imersa em incertezas, insegurança e desconhecimento.

Deste modo, o futuro, embora incerto, está a condicionar o presente, quer no que respeita ao conteúdo das contas anuais, quer no que se refere à tomada de decisões por parte dos utilizadores da informação financeira. Assim, é necessário incutir na informação financeira a representatividade tempestiva da imagem útil, de forma a proporcionar aos utilizadores uma qualidade de informação mais adequada às exigências. Parece-nos incontestável que a Contabilidade, assim como a Auditoria, têm de evoluir de forma a poderem contribuir de uma forma mais decisiva para a construção de uma maior estabilidade económico-social, enquanto instrumentos de comunicação de uma realidade que se quer, cada vez mais, adequada às exigências do futuro.

 
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