Crescimento do sector empresarial local - interesse público e racionalidade económica do fenómeno |
3. Notas finais
Os resultados a que chegámos, permitem destacar um conjunto de problemas, na sua maior parte de índole jurídico formal mas que, indiciariamente, têm na sua génese a indefinição do "verdadeiro" trajecto que melhor serve os interesses de prestação de serviços públicos ou de simples tarefas confiadas à administração local, com ganhos de qualidade, eficiência e eficácia na utilização de recursos públicos, e consequente diminuição do endividamento e da despesa pública, derivadas da redução do peso do Estado na vida económica.
O regime jurídico definido para as empresas públicas, de âmbito municipal ou intermunicipal, apresenta um vasto conjunto de insuficiências, incoerências e falta de clarificação de relevantes aspectos para o controlo de dinheiros públicos confiados em primeira mão à administração local, com eventuais desperdícios dos parcos recursos públicos e a potenciação de distorção das regras de mercado e da concorrência que se impõe observar.
Face às situações detectadas, umas confirmadas e outras a confirmarem-se (potencialidades que estatutariamente se encontram definidas), podemos então concluir pela ingerência pública no mercado livre de oferta de bens e serviços, e pela proliferação de empresas financeiramente dependentes dos seus promotores, na ordem inversa à máxima de "Menos Estado, Melhor Estado".
No limite, poderemos estar perante reais transformações da despesa e défice público, escapando assim quer às restrições de contenção de endividamento por parte daquelas (autarquias locais e entes equiparados) quer ao próprio controlo dos efeitos que a opção por criar novas pessoas colectivas (públicas e de direito privado) poderão vir a assumir, mais tarde, com hipotéticos e indesejáveis efeitos, quiçá, para o todo nacional.
Finalmente, concluímos pela necessidade de reflexão sobre o trajecto que se pretende atingir com a liberdade de opção legalmente existente de criação de empresas públicas de âmbito municipal ou de âmbito intermunicipal e de sociedades constituídas nos termos da lei comercial com participação no capital detida por autarquias locais e entes equiparados.
Em suma, sugerimos o aperfeiçoamento de vários diplomas, fazendo menção, quer a diversos aspectos acabados de referenciar, quer a outras situações não identificadas por economia do presente texto. Neste contexto, sugerimos as alterações seguintes:
± Da Lei nº 58/98, de 18 AGO com o propósito de:
Alargamento do âmbito de aplicação da presente lei às empresas públicas, de capitais públicos ou de capitais maioritariamente públicos a constituir pelas Grandes Áreas Metropolitanas ou, em alternativa, que seja criado o necessário regime jurídico;
Clarificação das circunstâncias em que as empresas constituídas até à entrada em vigor da presente lei se encontravam obrigadas a adaptar os respectivos estatutos à presente lei; Inclusão dos empréstimos contraídos pelas empresas públicas de âmbito intermunicipal na contagem para os limites de endividamento dos municípios participantes da Associação de Municípios ou outras Comunidades Locais;
Centralização do poder de aprovação de alterações estatutárias nos órgãos deliberativos das entidades locais que criaram ou participam nas empresas públicas;
Eliminação da alínea h) do art. 16º que inclui, no âmbito do exercício dos poderes de superintendência, a definição do estatuto remuneratório dos membros do conselho de administração pelas câmaras municipais e pelos conselhos de administração das associações de municípios, consoante o caso;
Atribuição ao órgão deliberativo de autorização casuística para a participação das empresas públicas (municipais ou intermunicipais) em outras pessoas colectivas, públicas ou privadas, retirando esse poder às câmaras municipais ou aos conselhos de administração das associações de municípios;
Definição de conteúdos mínimos para a celebração de contratos-programa entre os municípios e entidades equiparadas e obrigatoriedade de monitorização dos resultados alcançados com evidências nos documentos de prestação de contas dos municípios e associações de municípios;
Previsão de sanções, designadamente de natureza contra-ordenacional, para o incumprimento de publicitação dos resultados de gestão em Diário da República.
± Da Lei nº 169/99, de 18 SET (Regime Jurídico de Organização e Funcionamento das Autarquias Locais), de forma a contemplar:
Que na sessão ordinária da Assembleia Municipal em que sejam aprovados os documentos previsionais dos municípios, sejam igualmente apreciados os documentos previsionais das empresas públicas em que o município participe;
Que na sessão ordinária da Assembleia Municipal a realizar em Abril sejam apreciados os resultados da gestão das empresas públicas em que o município participe.
± Da Lei nº 42/98, de 6 AGO (Lei das Finanças Locais) no sentido de:
Referenciar expressamente no n.º 7 do art. 23.º que é vedado aos municípios quer a prestação de garantias pessoais quer de garantias reais;
Clarificar se as autarquias locais e entes equiparados podem conceder mútuos e efectivar suprimentos a pessoas colectivas (públicas e/ou privadas);
Adequar a redacção do n.º 5 do art. 24.º de forma a clarificar se os empréstimos de curto prazo contraídos pelas empresas públicas municipais também relevam para o apuramento da capacidade de endividamento dos respectivos municípios;
Sujeitar a obrigatoriedade de mencionar os movimentos financeiros realizados entre os municípios e as empresas, prevista no nº 4 do art. 9.º, a todos os tipos e âmbitos de empresas públicas em cujo capital os mesmos municípios tenham participação;
Que o n.º 1 do art. 9.º, passe a prever a apreciação das contas das empresas públicas em que os municípios participam;
Definir que os princípios previstos na lei para a concretização das políticas tarifárias e de preços associadas aos serviços a prestar pelas autarquias locais, são igualmente aplicáveis aos entes empresariais, de modo a assegurar que os órgãos de gestão garantam a sustentabilidade financeira da respectiva exploração.
± Da Lei nº 29/87, de 29 JUN (Estatuto dos Eleitos Locais), de forma a:
Prever a inerência de funções dos eleitos locais que cumulativamente sejam gestores de entidades societárias (empresas públicas ou sociedades comerciais) detidas ou maioritariamente participadas pelas respectivas autarquias locais e entes equiparados.
± Da Lei nº 64/93, de 26 AGO (Regime Jurídico de Incompatibilidades e Impedimentos dos Titulares de Cargos Políticos e de Altos Cargos Públicos), no sentido de:
Definir a obrigatoriedade de um registo de interesses nas autarquias locais e entes equiparados, da competência das respectivas assembleias locais e equiparados, à semelhança do previsto na Assembleia da República segundo o preceituado no nº 1 do art. 7.º.
± Do DL nº 54-A/99, de 22 FEV (Plano Oficial de Contabilidade das Autarquias Locais) com o propósito de expressamente enunciar:
As condições em que as entidades obrigadas a este tipo de contabilidade devem adoptar contabilidade de custos;
Concretizar, nas notas técnicas, as entidades que podem beneficiar de empréstimos a conceder pelas autarquias locais e outros entes a que se aplica este plano específico.
Que seja criado o estatuto do gestor público local por forma a estabelecer e disciplinar os direitos e obrigações dos gestores das empresas municipais ou intermunicipais, prevendo, expressamente, a impossibilidade de os eleitos locais, que representem o município ou sejam designados para o exercício de funções nos órgãos sociais das empresas, auferirem outras gratificações ou regalias sociais para além das que têm direito pelo exercício das funções nos órgãos autárquicos.