Os movimentos de reforma e a "accountability"
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3. O carácter democrático da Administração Pública

3.1. Em busca do significado de “accountability”

Nas sociedades democráticas aceita-se como natural e espera-se dos governantes e do serviço público, que sejam responsáveis perante os cidadãos, acreditando-se que o fortalecimento da accountability e o aperfeiçoamento das práticas administrativas caminham lado a lado. Utilizámos intencionalmente e por agora a palavra accountability, na sua expressão original, já que, de facto, parece, ainda hoje, não existir uma tradução simples para português. De facto, ao longo dos anos foi-se verificando que o que faltava em Portugal não seria propriamente a tradução da palavra accountability, que sempre poderia ser traduzida por prestação de contas, mas o próprio conceito, com consequências graves para a noção da própria democracia. Assistíamos, e em parte persiste, por parte dos políticos e dos funcionários da administração, ao desrespeito pelos cidadãos (exceptuando, naturalmente, aqueles que têm um conhecimento pessoal do interlocutor) e a uma frequente falta de zelo pelos dinheiros públicos, e, pelo lado dos cidadãos, a uma atitude de relativa passividade quanto ao favoritismo, ao nepotismo e ao desperdício de recursos. Fica-nos a dúvida sobre as razões que levam as pessoas a ser tão complacentes: porque é que os cidadãos não têm consciência dos seus direitos como contribuintes, se comportam como clientes e não como patrões nas suas relações com os serviços públicos, porque é que os funcionários públicos se consideram empregados dos seus chefes e não dos cidadãos. Sendo a linguagem um sistema de códigos para a transmissão de símbolos e ideias, uma palavra inexistente, numa das línguas mais ricas do universo, sublinhe-se, é um indício, por certo, da ausência de um aspecto da realidade e da maneira como a sociedade o percebe.

Em Portugal, destacaríamos, em termos institucionais, como causas do défice de accountability:

Quando falamos de prestação de contas ligada ao sector público podemos encontrar 4 grandes tipos [11]:

Mosher (1968) apresenta a palavra accountability como sinónimo da obrigação de responder por algo, de responsabilidade objectiva, e como conceito oposto, mas não necessariamente incompatível, a responsabilidade subjectiva. Enquanto a responsabilidade subjectiva vem de dentro da pessoa, a accountability, sendo uma responsabilidade objectiva, acarreta a responsabilidade de uma pessoa ou organização perante outra pessoa, fora de si mesma, por alguma coisa ou por algum tipo de desempenho. A propósito da noção de responsabilidade, Tavares (2003) identifica-a como “o estado em que alguém (responsável) se encontra, pelo qual, por força de um compromisso (…) fica sujeito a responder, a «prestar contas» pelos seus actos”, identificando seis tipos de responsabilidade no âmbito da gestão pública, a saber, responsabilidade política (apreciada por órgãos políticos), criminal e civil (ambas apreciadas pelos tribunais), disciplinar (apreciada pelos órgãos da Administração), financeira (apreciada pelo Tribunal de Contas) e social (apreciada pela sociedade).


 
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