Crescimento do sector empresarial local - interesse público e racionalidade económica do fenómeno
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2.7. Aparente cumprimento de limites ao endividamento

A possibilidade de participações indirectas dos entes locais em sociedades comerciais, por via das empresas públicas, legitima a concessão de financiamentos às sociedades participadas, potenciando o risco de contorno de uma série de restrições legais, como sejam, as relativas aos limites de endividamento municipal.

Note-se que, a lei impede as empresas de contraírem empréstimos a favor das entidades participantes, bem como de intervirem como garantes de empréstimos ou outras dívidas dos seus promotores [30], mas não impossibilita que as empresas prestem garantias às entidades por si participadas.

No que respeita ao endividamento dos municípios, tenha-se presente que, os empréstimos de médio e longo prazos contraídos pelas empresas públicas de âmbito intermunicipal não têm reflexos nos limites de endividamento dos municípios participantes, uma vez que a lei limita aqueles reflexos apenas aos empréstimos contraídos por empresas públicas municipais.

Tal facto, poderá potenciar a constituição de empresas do tipo públicas e de âmbito intermunicipal, com o intuito de, desse modo, não condicionar a capacidade de endividamento dos municípios participantes, sendo certo que para o défice do Sector Público Administrativo (SPA) contam apenas os encargos assumidos pelas autarquias locais e entes equiparados, excluindo-se desses os derivados do Sector Público Empresarial (SPE), no qual se integram o tipo de empresas a que nos reportamos.

Acresce ainda que, por via dos denominados planos de financiamento/pagamento de empreitadas, constatamos que as empresas têm vindo a criar novas formas de gerar financiamentos.

Na prática, o pagamento do valor das empreitadas, no período de 5, 10, 15 ou 20 anos, não difere das situações em que as empresas pedem dinheiro à banca, por determinado período, para pagar as facturas ao empreiteiro.

O plano de financiamento/pagamento exigido, nos termos do caderno de encargos, define e separa o pagamento dos trabalhos realizados e dos encargos financeiros.

Nestes casos, as empresas contraem dívidas junto dos empreiteiros, amortizando-as, ao longo do período proposto (10, 15 e 20 anos), em regra, em prestações iguais e mensais, independentemente do prazo de execução da obra, o qual pode ser de 180 dias.

Não obstante o que antecede, nos termos do regime de realização de obras públicas, o pagamento do preço das empreitadas deve ser efectuado em função das quantidades de trabalhos efectivamente realizados, e tem de existir uma real correspondência entre a execução física e financeira dos investimentos.

Deste modo, as empresas obtêm o mesmo resultado que obteriam caso tivessem optado por contrair empréstimos junto da Banca, com a vantagem de, por esta via, não contar para os limites legais de endividamento dos respectivos municípios, sem necessidade de sujeitar a autorização prévia do órgão executivo da autarquia local, no uso dos correspectivos poderes de superintendência desta última [31].

Nas situações em apreço, a liberdade contratual das partes tem necessariamente de se restringir aos modos de realização e correspondente pagamento de empreitadas de obras públicas [32], especialmente previstos e regulados na lei, a qual faculta a opção, balizada também por lei, de escolher o tipo de regime associado à obra a executar, mas não de escolher o prazo para pagamento das obras a realizar.

Deste modo, a construção de infra-estruturas com o recurso à assunção de encargos que oneram orçamentos futuros, em face do prazo contratado com os empreiteiros, obvia ou dificulta a transparência e rigor do endividamento da empresa, e, consequentemente, do município.

Por outro lado, e sem prejuízo da liberdade contratual que assiste às partes (empresa/empreiteiro), questiona-se a legalidade de os empreiteiros em referência se disponibilizarem e encontrarem a financiar obras públicas, devendo constituir uma preocupação para os gestores públicos a efectiva análise custo-benefício assente na identificação dos custos que a empresa teria de suportar junto da banca e os custos que oneram os investimentos realizados com recurso a tal expediente.


 
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