Finalidades extrafiscais da tributação especial do consumo
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2.2. Correcção de exterioridades

Relacionado, de certo modo, com este último objectivo extrafiscal, surge um outro relativo à necessidade de correcção ou interiorização de exterioridades [13]. No entanto, contrariamente à anterior, esta finalidade procura fundamentar a tributação especial em bases dotadas de maior objectividade e não apenas em posições meramente valorativas. Com efeito, em conformidade com este objectivo, os impostos especiais de consumo visam a interiorização dos custos externos (e, eventualmente, internos) associados ao consumo de determinados bens que não se encontram reflectidos nos respectivos preços finais, contribuindo, dessa forma, para uma mais eficiente afectação dos recursos.

As exterioridades consistem, basicamente, nos custos ou benefícios de transacções que não se encontram reflectidos nos preços dos respectivos produtos, traduzindo, assim, falhas de mercado tendo em vista a busca de eficiência económica [14]. Na verdade, na medida em que a produção ou o consumo de determinados bens provoquem custos à sociedade que não sejam pagos pelos respectivos consumidores (exterioridades negativas), é provável que sejam afectos recursos em excesso à produção ou consumo desses bens. Por outro lado, na situação inversa, quando a produção ou o consumo de certos bens propicie benefícios sociais que não sejam creditados aos consumidores (exterioridades positivas), é previsível que os recursos afectos sejam insuficientes. Ora, nestas situações, a introdução de um imposto ou um subsídio, consoante o caso, levará à interiorização dessas exterioridades, negativas ou positivas, respectivamente, através da sua consideração nos preços finais dos produtos. Assim, relativamente à possibilidade de implantação deste tipo de tributos, alguns autores referem-se à tributação "correctiva" ou "pigouviana" [15].

Ora, este objectivo extrafiscal de interiorizar as exterioridades negativas costuma, usualmente, ser atribuído a alguns dos impostos especiais sobre o consumo que recaem sobre os denominados "bens tradicionais", nomeadamente o tabaco e as bebidas alcoólicas [16]. Com efeito, tem sido frequentemente invocada como justificação para esta tributação especial a existência de variados custos, de diversa natureza, associados ao consumo de tais bens que, por não se encontrarem incorporados nos respectivos preços, legitimam, desse modo, o estabelecimento de impostos "correctivos" [17]. A este respeito, para além dos habituais e conhecidos custos externos, ligados, designadamente, à saúde - mas abrangendo ainda outros variados domínios como os acidentes de viação, para o álcool, ou os incêndios, para o tabaco, a título meramente exemplificativo -, são, por vezes, também referidos custos internos, atinentes principalmente à falta de informação suficiente e adequada do consumidor acerca das reais consequências do seu comportamento.

Assim, dentro deste enquadramento, a tributação especial de certos bens corresponderia à vontade de desencorajar o consumo excessivo desses produtos e à preocupação de financiar as despesas públicas decorrentes de tal consumo, concorrendo, desse modo, para a eficiência na afectação dos recursos. Todavia, se é inegável a existência de custos associados ao consumo, nomeadamente, de tabaco e bebidas alcoólicas, é igualmente certo que proceder à sua identificação e, sobretudo, quantificação rigorosas é uma tarefa extremamente complexa [18]. Acresce que uma qualquer solução para este problema dificilmente poderá ser generalizada, dadas as diferentes condições sociais, económicas e culturais dos distintos países. Desta forma, não surpreende que os inúmeros estudos que têm sido efectuados acerca dos custos daqueles dois tipos de produtos muitas vezes cheguem a conclusões diversas, designadamente acerca da questão, fundamental, que consiste em determinar se tais custos já se encontram cobertos ou não pelos impostos que actualmente gravam tais produtos [19].

No entanto, apesar das inegáveis dificuldades na concretização deste objectivo extrafiscal, atenta, desde logo, a problemática determinação dos custos ligados à produção e ao consumo dos bens em causa, esta justificação da tributação especial do consumo afigura-se, aparentemente, como uma forma de legitimação racional e coerente da imposição agravada de determinados produtos. É certo, contudo, que, em regra, o consumo deste tipo de bens se caracteriza pela sua pouca sensibilidade a variações de preço, dada a reduzida elasticidade da sua procura, como vimos, o que concorre para que a sua tributação seja particularmente atractiva na óptica da obtenção de receitas fiscais. Com efeito, sobre estes bens recai, por norma, um nível de tributação bastante elevado, sem que, todavia, como atrás referimos, ascenda a patamares suficientemente altos que originem reduções significativas do respectivo consumo [20].

Este fim extrafiscal da tributação especial do consumo encontra-se particularmente em voga, na actualidade, por referência aos aspectos ligados à ecologia, dando origem aos denominados impostos "ambientais" [21]. Neste domínio, são, assim, sobretudo os custos resultantes das actividades económicas com impacto no ambiente que têm justificado o surgimento de novos impostos ou a reformulação de alguns dos existentes, tendo em vista uma mais eficiente afectação dos recursos [22]. Neste domínio, perspectiva-se, assim, que a política fiscal, para além de outro tipo de considerações, poderá desempenhar um papel relevante no sentido da preservação do ambiente: por um lado, contribuindo para modificar o comportamento dos agentes económicos de forma a incrementar a utilização de matérias-primas e produtos intermédios menos poluentes; por outro lado, potenciando a alteração dos hábitos dos consumidores, de modo a ser privilegiado o consumo de produtos menos nocivos para o ambiente.

Refira-se, a este respeito, entre nós, a recente alteração do imposto sobre os produtos petrolíferos, o qual passou a designar-se imposto sobre os produtos petrolíferos e energéticos, tendo em vista abranger a globalidade dos produtos energéticos. Esta modificação foi operada pela Lei n.º 107-B/2003, de 31.12, que procedeu à transposição da Directiva 2003/96/CE, do Conselho, de 27.10.2003, tendente à instituição de um quadro comunitário da tributação global dos produtos energéticos que, entre outros, tinha como objectivo facultar aos Estados-membros da União Europeia a possibilidade do recurso à tributação desses bens com o propósito de prosseguir finalidades ambientais [23].

 
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